23/03/2009

Publicado originalmente na revista VISUAL SURF em 1982-reencontrado num blog em 2008:themanusideoflife.blogspot.com

Pra ser radicalNINO BELLIENY

"Surfar... não é só meter-se em pé sobre a prancha, executar manobras exímias e arriscadas. É antes, o contato com o cósmico, com a essência da natureza, alquimia de vento e sal. É fazer parte da onda, seguir seus movimentos e então dominá-la , cativá-la. Integrando na hidrodinâmica, nas realizações de cada batida, nas relações indescritíveis entre o infinito e a vida. É saber ver as horas no sol, as direções do vento, as condições do tempo, ler o rumo das estrelas, à espera de outra manhã.
É amar a prancha, como se ama a menina querida, num ritual místico, que começa no primeiro encontro e só termina quando um dois se espatifa. Mas não há final, para quem penetra nos mistérios da natureza e o surfista é essencialmente natural, pois assim como az o ciclista na terra, não existe nada além que o esforço físico, o domínio da mente sobre as ações e a compensação final. Não há combustível, como motos, aviões.
É a força, o jeito, os sentidos puros e selvagens.
Surfar... arrepio, um verdadeiro swell na espinha, um relâmpago que eletriza, dourado, prateado, ultra-colorido, um conjunto homem-prancha, que se fundem, num só objeto. Não fosse a prancha um desenho geométrico de proporções definidas, réplica aquática das pirâmides, depósito, ponto de atração de poderosas energias, cósmicas, descomunais. Há nisto tudo uma conexão transcendental, inexplicável e eterna.
Muitos encaram o surf como comércio, auto-apresentação para ganhar espaços nos jornais. Tudo muito merecido, quando se é fera por dentro, quando além destas perspectivas existe apenas pelo que se faz e se enxerga o surf como vida, como religião.
Alguns conseguem tal. Estes merecem real, serem chamados de senhores das ondas. Continuadores do milagre...
Surfar, não é usar as melhores marcas, os melhores equipamentos. Surfa-se em prancha de madeira, em prancha velha, com roupas rasgadas e até sem. Use o melhor, sim, se puder afinal você tem o direito. Mas mostre qualidade mesmo, é lá, na boca da wave, no “swell da espinha”... Sejam antes de tudo, você, mestre das próprias ações e palavras. Sem essa de papo molhado na areia, nos barzinhos. Pois “surfistas de brejo”, existem aos montes. E os melhores, os autênticos deslizadores, não gastam pão furado, não atolam. Há tempo de ser bom, de pegar uma de respeito, de aprender sempre fazer mais e mais amigos... Não preocupa-se com opiniões destruidoras, não fica down à toa. Antes de tudo, pense em melhorar-se como surfista e ser humano, colaborando para a boa imagem do esporte. Que é algo mais que um esporte...
Não queira ser fera antes do momento.
Fera não é o melhor, sim, o que se dedica mais.
E fera mesmo é quem surfa sem prancha e sem ondas...
Aí sim, quero ver..."
Nino Bellieny – Editorial da Revista Visual Surf-1982

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