Um jornal
Publicada em 05/12/2008 às 14h26m
Artigo de Nino BellienyÉ feito de papel, tinta, letras, imagens, imaginação, talento, suor e amor. Antes de chegar às muitas mãos e deitar-se sob os olhos que o lerão, terá passado por cérebros,máquinas e outras mãos. Foi arrumado, embalado e transportado para ser devorado por mentes sedentas de conhecimento.
Daqui a pouco, poderá ser guardado, recortado, embrulhar peixe, forrar piso de carro, recolher fezes de cães. Irá parar nos lixões, rolará ao vento, substituirá papel higiênico, será arquivado nas bibliotecas, anexado a processos jurídicos encaixotado em repartições.
Como a vida humana, não se prevê o destino de cada edição de um jornal. Elogiado, criticado, amado e odiado. Formador e deformador de opiniões. Venenoso ou amoroso, amargo ou saboroso, dependerá do paladar que o degusta. A notícia já envelheceu, e ele, o Espírito do Jornal sabe disso, farejando a novidade que dura apenas um segundo. A novidade já caiu do galho bicada por passarinhos famintos e ele, o Espírito do Jornal, irá antecipar, criar, recriar, reciclar, inventar, construir e destruir centenas de egos, vaidades e reputações.
Muitos pagariam o que não podem para ter o nome em destaque. Muitos pagam caro demais. Alguns dizem detestar. São os que mais gostariam e quando acontece, lêem e relêem, mostram aos amigos, recortam e guardam. Uns sofrem imaginando o porque de nunca terem saído, outros esnobam por sair muito.
Tem quem ame as colunas e os artigos as crônicas. Quem odeie os colunistas, articulistas, os cronistas, enfim, os jornalistas, estes seres em desassossego constante. Há os que picham os fotógrafos ou enalteça-os, quando a tão sonhada foto aparece.
Internet, TV, rádio e outros meios pululam para quase todos. Porém, é aqui onde pode ser tocado, cheirado, sentido e carregado através da materialidade, que se concretiza o sonho da maioria: Das meninas bonitas em busca do reconhecimento, do empresário que veio do nada e finge humildade, do jogador de futebol atrás da glória, do secretário municipal carente de afirmação, do vereador assistencialista e vaidoso, do prefeito correndo atrás de prestígio, do deputado de olho na reeleição, do eterno pré-candidato a tudo, do puxa-saco de olho num gordo cargo e de uma seleção de pessoas dissimuladas.
Mas, há também o herói de cada dia, a idéia inteligente, o gari honesto que achou a mala com dinheiro e devolveu, o padre correto, o pastor desinteressado, o taxista leal, o policial íntegro e o juiz competente. Tem o corrupto e o corruptor.O ladrão e o roubado.O ativo e o cansado.
Tem de tudo no supermercado do jornal. Gente boa e péssima gente. Um varal onde almas humanas ficam dependuradas em constante exibição. Nada diferente do costume. Parecido com uma festa onde olhares de inveja e admiração se cruzam e comentários maldosos se disfarçam debaixo de sorrisos congelados.
Em um jornal a miséria e riqueza plantam bananeiras e saber qual o fruto é o bom e o venenoso é uma experiência única .Tanto para quem escreve como para quem lê.
No primeiro caso,correndo o risco de ser "bem" interpretado. No segundo, o de "bem" interpretar. Compreender e ser compreendido num universo de tantos interesses, nem sempre significa ser verdadeiro. Há gente que só consegue enxergar o que lhe for mais conveniente. Para estes, só existe um remédio: a página em branco.
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